Por Rodrigo Dreux - Colunista de Vinho e gastronomia
Alguém já se perguntou se vinho pode se encaixar na categoria de produto vegano? Afinal, por se tratar de uma bebida obtida através da fermentação da uva, é mais do que natural que se enxergue o vinho como tal. Contudo, posso afirmar que boa parte, pra não dizer a maioria, dos vinhos não são! Mas pode isso, Arnaldo?
Para um vinho ser produzido e comercializado, ele passa por vários processos distintos, do vinhedo à garrafa e em algumas dessas etapas, produtos de origem animal podem ser utilizados principalmente no acabamento da bebida. Chocados?
Entre os processos adotados na fabricação do vinho, um especificamente, tende a fazer uso de componentes animais. Falo do processo de clarificação ou filtragem, que como o nome já diz, tem como objetivo clarificar, filtrar e purificar o vinho que após a vinificação pode apresentar sedimentos e partículas sólidas, além de uma aparência turva e opaca. Assim, é muito comum adicionar albumina (clara de ovo) no vinho dentro do tanque para remover impurezas e deixá-lo mais límpido e com brilho.
Isso ocorre, pois a albumina serve como um ímã para que os sedimentos sólidos que se encontram nos vinhos fiquem colados nela (não é por menos que esse processo também é chamado de colagem) e depois descartados antes do engarrafamento. É também permitido usar gelatina e colágeno de origem animal para a clarificação, e até mesmo a Caseína, proteína do leite super famosa no meio da musculação.
Esses produtos, além de tirarem a turbidez do vinho, funcionam como aceleradores de evolução, fazendo que o vinho fique pronto para consumo mais rápido. No entanto, é válido ressaltar que, por mais que se possa fazer uso de proteína animal no processo de clarificação do vinho, nem com análise laboratorial dá pra se identificar componente animal no líquido em si. Porém, por uma questão legal, informa-se no rótulo que o produto pode conter traços de proteína animal.
O veganismo no consumo do vinho é mais uma questão ética e conceitual.
Vinho vegano existe de fato?
Com o aumento de pessoas aderindo ao veganismo, seja por questões de saúde, consciência ou gosto, é normal procurar cada vez mais por produtos desse segmento. Produtos orgânicos também estão em alta, mas no caso dos vinhos a filosofia orgânica se aplica nos vinhedos, nos quais não são utilizados defensivos agrícolas e componentes químicos. Assim, vinhos orgânicos podem também conter traços de proteína animal.
Mas será que existe uma luz no fim do túnel para os enófilos veganos?
Claro! Se uns anos atrás era preciso procurar nas letras miúdas dos contra-rótulos informações dizendo que tal vinho não tinha passado por processo de clarificação ou que havia sido filtrado com produtos de origem vegetal, hoje está muito mais fácil. Existe uma certificação de vinho vegano que fica estampada (literalmente) na garrafa.
Cada vez mais as vinícolas, das gigantes até as artesanais, tem investido pra conseguir esse certificado para atingir uma fatia considerável de mercado, se adequar às tendências de consumo e atrair um público qualificado que enxerga nas práticas de sustentabilidade um diferencial positivo.
E falando sobre sustentabilidade, outra dica é experimentar vinhos biodinâmicos e os, cada vez mais no hype, naturais ou naturebas que é como os adeptos do estilo adoram chamar. É uma categoria de vinho que trabalha com o conceito de "mínima intervenção” na elaboração do vinho, no qual as condições naturais são quem determinarão as características de cada rótulo. É a expressão máxima da uva e da natureza. Devo confessar que o natureba não é o estilo mais fácil do mundo de se gostar de cara, pois muitas vezes o vinho é um tanto rústico, ácido e bem leve.
Agora, voltando para os vinhos veganos, não poderia terminar sem indicar um vinhozinho, né?! E como eu falei antes, cada vez mais empresas tem adotado o conceito vegano, é muito legal vermos a nossa indústria nacional entrando de cabeça. A gigante Miolo Wine Group se tornou 100% vegana e possui o selo da The Vegan Society. O processo de produção de todas as diversas linhas de produtos do portfólio da marca não faz uso de nenhum componente de origem animal na elaboração.
Vamos de vinho?
Miolo Reserva Syrah - Belíssimo exemplar produzido no Vale do São Francisco na Bahia com uvas colhidas no inverno. Frutas vermelhas e pretas no nariz, muitas especiarias como pimenta do reino, notas de madeira e tostado. Na boca tem corpo médio, taninos macios e acidez na medida. Ótimo para carnes vermelhas e já que é um vinho do nordeste, tente harmonizar com uma bela alcatra de sol na manteiga de garrafa e depois me conta.
Espero que tenham gostado e se animado para provar muitos e muitos vinhos veganos!
Beijo,
Rodrigo Dreux